Quem se lembra de uma letra e de uma música por sinal feitas por mim) em 1970 do JOÃO SOLDADO?
Rezava assim:
O pobre João
Anda a chorar,
Está sem tostão,
Vai Pr'ó Ultramar.
Matar é o lema,
Seja lá quem for...
Matem-se os pretos
São de outra cor.
João anda triste,
Pois não quer matar,
Mas logo lhe gritam:
- Toca a disparar!
Não vamos matar
Os pretos da terra
Vamos matar antes
Os que querem guerra.
Pois é...
À custa desta letra estive 2 anos sem pôr os pés em Coimbra.
Passo a contar:
Quando numa bela tarde de Maio de 1970, com a minha inseparável viola, cantei esta balada de intervenção no Salão Nobre do Seminário Maior de Coimbra, com a sala apinhada e a presença do ilustre Reitor Manuel Leal Pedrosa (que no final ficou com o rosto mais vermelho que um tomate), fui surpreendido com a interpelação de um indivíduo que já conhecia do C.A.D.C. (Centro Académico da Democracia Cristã) - o mesmo por onde tinha passado o António de Oliveira Salazar - coincidências !!! ... a perguntar-me se sabia o que tinha acabado de cantar. Com toda a convicção dos meus 17 anos disse-lhe que sim. Resposta do dito cujo indívíduo: - Olhe que não é bem assim. Tenha cuidado que as coisas não são como o senhor pensa. Calei. Fiquei mais pequenino que um grão de areia e fiquei a matutar naquilo que o fulano ma tinha dito.
Resultado: Como quem tem c... tem medo... estive 2 anos sem colocar os meus pézinhos em Coimbra com receio de ir parar com os costados a algum calabouço da PIDE/DGS.
Mas a história não acaba aqui.
Em Abril (25) de 1974 estava eu em Évora e, por força das circunstâncias e do lugar que ocupava na hierarquia militar, tive acesso aos arquivos da de boa memória PIDE/DGS. E qual não foi o meu espanto ao deparar com a minha ficha onde constava, entre outras coisas: REVOLUCIONÁRIO A SER CONTROLADO.
Moral da história: é graças a este espírito revolucionário (adquirido muito dele com o Chico Matos a ouvir Zeca Afonso - assim aprendi a tocar todas as músicas do Álbum «Cantares do Andarilho» e no Clepsidra) que hoje recordo estes factos da minha passagem por Coimbra.